(Parte 4 de 7, publicado originalmente em maio de 1989, na revista Guitar Player norte-americana.)
Seu rosto revela muito de sua personalidade. Quando as pessoas falam, elas usam os rostos, além das vozes. Às vezes, o verdadeiro significado do que elas estão tentando comunicar (ou não comunicar) fica visível no rosto e na linguagem corporal.
A linguagem corporal é uma parte importante da expressão Tente ter uma conversa do início ao fim enquanto mantém uma aparência de pedra, com o rosto imóvel — sem risadas, gestos manuais ou movimentos corporais, só com os lábios. Você vai ver que é muito mais difícil se expressar.
O modo como seu corpo se move reflete sua personalidade verdadeira. Quando alguém toca um instrumento, as linguagens facial e corporal desempenham funções expressivas importantes. Algumas pessoas mal se movem quando tocam. Isso não significa necessariamente que elas não estão se expressando, nem que a execução delas não diz nada — algumas pessoas emanam expressão de seu próprio ser. Isso também pode ser cultivado com a postura correta.
Às vezes, ao tocar, você toca uma nota ou acorde e suas expressões facial e corporal se contorcem para corresponder à expressão auditiva. Quando isso acontece, há um ar de liberdade e realização, e é muito agradável para o público.
Eis um exercício para ajudar você a usar seu corpo de maneira expressiva. Primeiro, grave uma situação musical — uma jam session, digamos, ou uma série de mudanças de acorde com um solo em cima. Escute a gravação e escolha uma seção em particular — uma mudança de acorde ou um riff — de que você goste. Escute a seção diversas vezes e imagine a música como uma “pessoinha” real (que se pareça com você, em princípio, ou com uma figura familiar como o Gumby[1]). Se a pessoinha fosse o riff, como seriam seu corpo e rosto? Como ele se contorceria para transmitir a quem o vê a impressão do som audível? (Isso pode ser bem divertido…)
Agora volte e escute a gravação de novo. Escute a passagem selecionada repetidamente, mas, enquanto você visualiza a linguagem corporal da pessoinha, imite-a com seu rosto e corpo. Você vai sentir mais as notas, e isso vai se transferir para a maneira de você tocar.
Outro exercício: Enquanto estiver improvisando, escolha um lick e toque-o em loop repetidamente. Enquanto faz isso, pense na ideia que está tentando expressar; depois, pense em como você se sente a respeito do que está ouvindo. Deixe o som se expressar em um certo movimento corporal. O movimento pode consistir em jogar a cabeça para trás, piscar um olho, um impulso com a pelve, ou em rolar no chão em um frenesi convulsivo enquanto monta em sua guitarra numa loucura erótica, revirando os olhos com as narinas abertas e com veias enormes e vermelhas saltando do seu pescoço — mas por favor, tenha cuidado. (Acho que sei que riff é esse, aliás).
Eu esbarrei em outro exercício quando tinha mais ou menos 12 anos de idade. Escolha uma peça musical familiar, como um trecho de seu solo preferido. Ao escutá-la, deixe que seu rosto se contorça e expresse a música. A primeira peça com que me lembro de fazer isso foi Midnight,[2] uma canção ótima de Jimi Hendrix do álbum War Heroes. Experimente essa técnica com sua própria música — deixe seu rosto expressar o que está saindo das suas caixas. Isso é muito divertido e bastante interessante. Quanto mais você se entusiasmar, mais a música ganhará vida.
É verdade que é necessária uma certa falta de inibição para usar essa técnica ao vivo, mas quem se importa? Não estou sugerindo que você use essas técnicas de linguagem corporal TODO o tempo. Porém, na luta infinita pela originalidade, você deve procurar nas profundezas da sua alma, e essas técnicas podem ajudar.
[1] Gumby é o personagem principal de uma franquia de animação stop motion de grande sucesso na televisão estadunidense.
Samurai Guitar
Tradução: Mariana Valente
Revisão e notas: Augusto Roza
Link para o original: http://www.vai.com/part-four/